quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Amigos do Grupo Escolar



A década de 50, dos governos de Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek que fomentaram o processo de industrialização nacional. Da vitória do Brasil que ganhou a Copa do Mundo de futebol, em 1958. A década da esperança, da industrialização, do rádio, da televisão e da velocidade. Mas, o símbolo maior deste processo de modernização foi a construção de Brasília, inaugurada em 1960, o ano que fui estudar o ginásio em São Luís.

Em Itapecuru, uma junta governativa assume, no lugar de João Rodrigues, que só consegue tomar posse em 1952 e Sinéas de Castro Santos que o sucedeu, de 1956 a 1961. Em
nossa cidade, o marco mais importante da década de 50, foi a construção da ponte sobre o rio Itapecuru.

 Em 1950, enquanto o mundo era reconstruído, após a Segunda Guerra mundial, meus pais, seguindo a tendência daquela época do êxodo rural no Brasil, mudaram-se da Mata para a cidade. Eu que nascera em 1944, estava com apenas seis anos. As dificuldades que atingiram o mundo, o Brasil e o Maranhão, chegaram até a minha família e fizeram que o casal tomasse a decisão de mudar-se. Meu pai, dono de engenho e minha mãe dona de casa, com sete filhos, numa região que não havia escola, queriam muito vê-los estudando.

Foi um recomeço difícil. Com a mudança, construção da nova casa e o nascimento do oitavo filho, o sonho do casal de colocar os filhos na escola só se concretizou em 1955, depois de conseguir registrá-los.  As cinco filhas, mais velhas, já alfabetizadas, estudaram na escolinha que ficava perto da estação do trem, com a professora Maria de Lourdes Matos.

Mesmo assim, não havia clima de desânimo. Meu pai, Euzébio Alberto da Silva, trabalhava no engenho com meu irmão mais velho e minha mãe, Rosenda Matos da Silva, cuidava dos filhos. Os mais velhos ajudavam com os menores. Não faltávamos às festas religiosas, começando com a de São Benedito, dia 1º de janeiro, Divino Espírito Santo, da Santa Cruz, de Nossa Senhora das Dores e a Semana Santa, não exatamente nesta ordem. Minha mãe que também costurava, caprichava no figurino da filharada.

 Cursei o primário no Grupo escolar Gomes de Sousa, entre 1955 e 1959, do primeiro ao quinto ano. As colegas do quarto e quinto anos, eu já com catorze e quinze de idade, eram várias. Entretanto, tínhamos um pequeno grupo que se reunia para estudar. Cada vez em casa de um. Outras vezes íamos para a casa de Dona Santinha (Anozilda) ensaiar os números das festas cívicas. Do grupo lembro-me de Sônia e Oswaldo Camelo, Francisca e Conceição Bezerra.  Eu era mais próxima a Francisca Bezerra (Chiquita), razão pela qual estou escrevendo este artigo, a pedido do neto dela, Breno Bezerra que, ao me ouvir falar das nossas peripécias de adolescentes, nas quais estavam incluídos o Sr. Carlos Bezerra e Dona Cotinha.

No primário tínhamos homenagens cívicas todos os dias, antes das aulas. A cada dia uma série era encarregada de fazer a apresentação, com textos lidos de acordo com a efeméride.
Lembro-me das professoras de cada turma: No primeiro ano, D. Santinha, no segundo, D. Maria do Rosário, no terceiro, D. Maria de Lourdes e D. Conceição, no quarto e quinto, D. Francisca, irmã da professora, Maria de Lourdes.

Os ensaios das atividades cívicas eram feitos em casa da diretora, Anozilda (Santinha), aonde a maioria das professoras que vinham de fora se hospedavam. Numa mesa enorme, com dois longos bancos, sentávamos para ensaiarmos nossos números: Uns cantavam, outros recitavam textos e o grupo cantava várias músicas em coro. Até hoje sou apaixonada pela poesia de Casemiro de Abreu, “Meus oito anos” que sempre era cantada nas comemorações. As festas das mães até hoje me emocionam, quando ouço as músicas que aprendi no primário e cantava para minha mãe.
D. Santinha morava pertinho da casa do alfaiate e músico, Carlos Bezerra. Quando terminavam os ensaios, Francisca me convidava para irmos a sua casa. Lembro-me de suas irmãs mais velhas: Conceição, Maria e Malvina.

Dona Cotinha e o Sr. Carlos eram muito simpáticos. Entrávamos pela porta da varanda, ao lado direito da frente da casa, onde o Sr. Carlos tinha algumas mesas forradas para o jogo de cartas. Eu deixava minha bolsa com material escolar sobre uma delas e enfiava-me pela casa, junto com Francisca e Conceição.

 Em casa dos Bezerra tinham algumas novidades que me encantavam: água puxada com uma bomba manual (quebra-galho) armazenada em toneis, dentro e fora do banheiro, que ficava no anexo a casa. Eu achava o máximo. Tão diferente dos nossos banhos no Rio Itapecuru. Eu achava divertido acionar a bomba para cima e para baixo e ver a água jorrar.

Eu tinha verdadeira atração pelo fogão a lenha, também no anexo a casa, em direção à outra porta de entrada, ao lado esquerdo da frente. D. Cotinha cozinhando, as labaredas altas, quase cobrindo as panelas e o cheirinho gostoso de café que nos servia com bolos e doces feitos por ela.

Eu costumava me espelhar em frente à alta penteadeira ao canto direito da sala, me via de corpo inteiro e como toda adolescente, me virava de um lado para o outro me admirando de todos os ângulos. Um dia, estava eu nesta atitude narcisista quando o cunhado de Francisca, marido de Maria, entrou na sala e disse que soubera do nosso banho de rio e que as meninas disseram que eu tinha um corpo muito bonito. Fiquei encabulada e Francisca disse-me que comentara sobre nosso banho no Rio Itapecuru, após o trabalho escolar e de apanhar verdura na grande horta da minha mãe para que todos levassem de presente.

Ao final de 1959, terminamos o quinto ano. Tivemos festa de formatura, meu paraninfo foi Benedito Nascimento, esposo de Adélia, prima de minha mãe. Antes do exame de admissão, no Colégio São Luís, fiz aulas de reforço com o professor, João Rodrigues, no Grupo escolar “Gomes de Sousa”, em horário especial.

Francisca e Eu fomos estudar o ginásio em São Luís. Acabamos nos perdendo de vista; encontramo-nos duas ou três vezes nas férias. Em 1962, me casei e fiquei em São Luís. Depois, mudamos para São Paulo e mais tarde para Santa Catarina. Ao voltar a Itapecuru, dez anos mais tarde, procurei Francisca e matamos as saudades, num longo papo. A Chiquita escrevia belas poesias. Fico curiosa de saber se chegou a publicá-las.

A menininha que saiu da Mata, do engenho do pai aos seis anos, em 1950, em maio completará 72 de muito trabalho, estudo, e militância literária. Com textos publicados no Brasil, Portugal, Espanha e França. Tudo, graças àquela iniciativa dos pais de se mudarem para que os filhos tivessem oportunidade de estudar.
 
Agradeço ao confrade Breno Bezerra pela curiosidade de conhecer alguns detalhes da minha convivência com seus familiares.

Praia do Anil, Magé – RJ, 28 de fevereiro de 2016
Benedita Azevedo


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